Faça parte do canal da Metropole no WhatsApp >>

Domingo, 28 de abril de 2024

Home

/

Notícias

/

Saúde

/

Queda da cobertura vacinal: população de Salvador está mesmo livre do sarampo?

Saúde

Queda da cobertura vacinal: população de Salvador está mesmo livre do sarampo?

Com a baixa adesão à vacina nos últimos anos e o número de casos crescendo no mundo, a doença acende o sinal vermelho na capital baiana

Queda da cobertura vacinal: população de Salvador está mesmo livre do sarampo?

Foto: Agência Brasil/Tânia Rêgo

Por: Daniela Gonzalez no dia 10 de abril de 2024 às 15:35

Do ponto de vista histórico, o movimento de oposição à vacina não é nada novo. O medo e a desinformação sobre a imunização, além de questões políticas, foram os combustíveis para a chamada Revolta da Vacina, em 1904. Assim como na Europa, no Brasil, a população não entendia a ciência por trás da vacina: por ser feita a partir do vírus causador da varíola bovina, circulavam boatos de que ela faria com que as pessoas parecessem um boi. Desde então, opositores da vacina têm se manifestado e ganharam nas redes sociais uma oportunidade mais fácil para disseminar informações imprecisas ou não comprovadas.

O atual movimento antivax (antivacina) foi inspirado pelo estudo, agora desacreditado, do médico britânico Andrew Wakefield, que em 1998 relacionou a vacina Tríplice Viral — contra sarampo, caxumba e rubéola — ao aumento do autismo em crianças. A vacina está em uso desde 1971. Antes de sua introdução global, 2,6 milhões de pessoas morreram de sarampo em 1980. Em 2016, o Brasil recebeu o certificado de eliminação do sarampo, concedido pela Organização Mundial da Saúde. Dois anos depois, o vírus voltou a circular e, em 2019, perdeu o reconhecimento de país livre do sarampo.

Salvador devidamente protegida? 
A capital baiana registra queda na cobertura da tríplice viral desde 2015. Naquele ano, o esquema alcançou 90,51%, caindo para 60,41% em 2016. O menor índice registrado foi em 2021, quando apenas 30,46% da população recebeu o imunizante. No ano passado, ele atingiu apenas 52,40%, apesar da meta estabelecida ser de 95%. Os dados são do Programa Nacional de Imunizações.

Professora do Instituto de Saúde Coletiva da UFBA (ISC) e doutora em Saúde Pública, Glória Teixeira faz parte do grupo de pesquisa que investiga se a população de Salvador está devidamente protegida contra o sarampo. Em 2001, quando a capital não teve nenhum caso registrado, o ISC fez um levantamento e constatou que 95,1% da população tinha anticorpos contra a doença. No entanto, com a baixa adesão, o cenário tem mostrado preocupação para os pesquisadores. Agora, eles estão mapeando se as pessoas que nasceram a partir do ano 2000 estão protegidas o suficiente.

"Após anos, Salvador teve casos confirmados da doença entre 2018 e 2020. Isso tem preocupado não somente as autoridades nacionais, mas também a Organização Pan-Americana da Saúde, que tem dado um alerta de que essas quedas das coberturas vacinais podem levar novamente a epidemia de sarampo", explica Glória.

Imunidade de coletiva
A pesquisadora faz um alerta para uma possível queda na imunidade coletiva. Por isso, os chamados "casos importados" despertam preocupação. Europa, Estados Unidos, Argentina e Venezuela têm apresentado registros de sarampo. Com os viajantes infectados, a população brasileira pode estar em perigo. "Se a doença chegar e não encontrar a população com os níveis necessários, o vírus pode voltar a circular".

É o que a OMS alerta. Entre os anos de 2018 e 2020, a Bahia registrou 90 casos da doença provenientes do vírus importados de outros estados. Em janeiro deste ano, a Secretaria de Saúde do Rio Grande do Sul informou um caso importado. Uma criança, vinda do Paquistão, desembarcou em São Paulo em dezembro do ano passado e logo após foi para o estado gaúcho. Ao sentir fortes dores, testes sorológicos confirmaram a doença.

Para não esquecer
Quando atuava na Secretaria de Saúde, como coordenadora da Vigilância Sanitária, Glória relembra o que vivenciou um dos picos da epidemia de sarampo no país. “Em 1988, só no Hospital Couto Maia, morriam cerca de 10 crianças por mês”, lamentou. À época, a campanha do Programa Nacional de Imunizações não era amplamente divulgada, e ainda faltava vacinas para a população. “Na década de 1980, de dois em dois anos, nós sabíamos que as epidemias começavam em Salvador, depois atingiam Feira de Santana e se espalhavam pelas cidades do interior do estado”, explica. 

Um estudo sobre a situação epidemiológica entre 1976 a 1976, divulgado pela Revista Baiana de Saúde Pública e obtido pelo Metro1, indica que a população foi atingida pela doença por uma incidência média de 48,6 por 100 mil habitantes, entre 1976 a 1980. Já em 1981 até 1986, passou para 102,7, representando um aumento de 111,4%. Além disso, as famílias de baixa renda e com padrão de habitação subnormal, foram as mais atingidas.